sexta-feira, 27 de junho de 2008

O espelho da caçula

Descobri que minha rotina em transportes públicos é minha grande inspiração no momento.
Cada trecho entre Canoas e a capital me faz pensar sobre algo diferente.

Pois estava eu na fila do ônibus para a faculdade quando presenciei aquela cena.

Havia, na fila ao lado, uma menina loirinha, de bochechas rosadas, quase sufocada em tantos casacos para suportar o forte frio daquela noite. Ela abraçava um senhor, que deduzi ser seu pai, e ele retribuia com reciprocidade absoluta.
Um passo atrás, uma menina mais alta, mais velha, já com bochechas não tão rosas.
Ela, então, abraça o mesmo senhor pelas costas, sendo que esse não tinha mais braços para retribuir o gesto, também.

Não precisei de muito para entender que ali estavam duas irmãs e seu pai.
A menorzinha, tão bonitinha em sua jaqueta rosa choque, era mais engraçadinha e carinhosa.
A mais velha, ao perceber estar de fora daquele momento, correu para fazer o que lhe parecia possível.

Não adiantou. A mais nova não saiu da frente do pai, que não conseguiu abraçar sua primogênita. Essa, por sua vez, desistiu e sentou-se no meio-fio.

Ali ficou, talvez pensando que crescer não é o melhor que pode haver. Queria voltar a ser a mais engraçadinha, quem sabe a única.
Foi quando a caçula sentou ao seu lado e a abraçou. Assim, da maneira mais espontânea que poderia ser.
Ficou sentada junto à irmã, olhando para ela e conversando, em um tom de imitação.

Penso que a mais velha não entendeu, ainda, o que significa ter nascido antes. Não viu o poder que tem sobre a menorzinha. Não vê como é bom olhar para ela pensando: já passei por tudo isso, querida. Já fui engraçadinha, bonitinha e bochechuda. Quero ver crescer e evoluir.

Ela ainda não havia percebido que a caçula se espelha nela, e que o fará por muito tempo na vida. Talvez para sempre.
E não percebeu por estar cega pelo medo de perder o abraço do pai, que ele só tenha braços para a outra.

Não entendeu que, com o nascimento da irmã, só ganhou dois braços a mais para abraçá-la.

3 comentários:

Ursula Boeck disse...

Que momento né Aloha! Muito verdadeiro isso que tu colocou, mas a verdade é que os irmãos maiores custam a entender como é importante este papel de serem espelhos para os menores,ficam presos a falsa sensação de terem "perdido seu espaço"...Nada que um bom abraço não resolva,não é?Te amooooooo

Anônimo disse...

Eu ia só ler e ficar quieto. Mas não resisti. Me emocionou, muito mesmo. Lindo demais. Que sensibilidade, Aloha. Parabéns.

Anônimo disse...

Quando tu escreve... Eu só leio. E... fico muda!
Amo, amo, amo...
Bjs